O projeto do governo de reforma trabalhista, modificado na câmara dos Deputados, gerou críticas e dividiu opiniões na reunião conjunta das Comissões de Assuntos Econômicos (CAE) e de Assuntos Sociais (CAS) na terceira audiência pública sobre a proposta. Economistas e representantes dos sindicatos e da Justiça do Trabalho participaram da audiência .

O Juiz do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (TRT-SP), Jorge Souto Maior, detectou 201 dispositivos contrários ao trabalhador no projeto de reforma (PLC 38/2017). Para ele o texto representa a “destruição do aparato jurídico da classe trabalhadora”, além de retirar muitos direitos e trazer inconstitucionalidades.

– O avanço trabalhista, garantido na Constituição, está sendo destruído completamente pelo setor econômico. A reforma é um desmonte, não tem base democrática. Se este projeto passar nós estaremos realmente desistindo do Brasil. Os juízes vão resistir – afirmou.

Para Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), o projeto beneficia apenas os grandes empresários. Ele criticou propostas como a exclusão dos sindicatos na homologação da dispensa do empregado e na negociação com os patrões, bem como o fim da obrigatoriedade da contribuição sindical.

– Quem gera emprego no Brasil é a pequena e a micro empresa, que precisam de um movimento sindical forte. Tem que se valorizar o principal protagonista da negociação, que é o movimento sindical.  Essa Casa é revisora, tem que dar o caminho certo para o nosso país – disse.

Na opinião do presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adilson Araújo, o projeto de reforma joga na “lata do lixo” as conquistas da classe trabalhadora, que estaria sendo prejudicada.

– Os senhores deputados e senadores poderiam ter regulamentado medidas modernas e que muitos países adotaram, para por fim à demissão imotivada, para acabar o descalabro na relação entre servidores públicos e governo e permitir direito de greve, organização sindical e negociação coletiva – argumentou.

Legislação

O economista Paulo Paiva, professor da Fundação Dom Cabral, ministro do Trabalho entre 1995 e 1998 no governo Fernando Henrique Cardoso, defendeu uma legislação que busque uma “solução inteligente” para as novas modalidades de contratação como a temporária, a intermitente e o teletrabalho.

– Hoje é necessária uma legislação que seja contemporânea à complexa e diversificada economia da era digital – observou.

Para ele, a reforma não mexe com os direitos sociais dos trabalhadores e é vantajosa ao flexibilizar as relações de trabalho para estimular o aumento da produtividade, além de reduzir os custos com a folha de pagamento.

Entretanto, o economista entende que somente o crescimento econômico vai gerar mais empregos no país, e não as mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Ele ainda questionou propostas relacionadas ao tratamento da empregada gestante ou lactante em ambiente insalubre e a definição de dano extrapatrimonial.

Mais incisivo, José Márcio Camargo, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), chamou de “falsos” os contratos de trabalho no Brasil, uma vez que eles podem ser renegociados na Justiça trabalhista, na ocasião da demissão do empregado.

O professor também disse que os sindicatos têm pouca representatividade e baixa filiação voluntária. Ele ainda atacou a rigidez das atuais regras contratuais e afirmou que a CLT prejudica pobres, jovens e mulheres que estão fora do mercado de trabalho formal.

– Na verdade, pela primeira vez depois de 80 anos, teremos uma reforma que muda completamente a estrutura e a lógica da CLT. Valoriza as negociações individuais e coletivas, fortalece os sindicatos, diminui a incerteza jurídica e cria contratos de trabalhos críveis, reduz a informalidade e o desemprego – ressaltou.

O deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), relator do projeto de reforma trabalhista na Comissão Especial da Câmara, criticou o “excesso de formalismo e burocracia” da atual legislação. Ele citou dados que apontam apenas 38 milhões de brasileiros com carteira assinada, de um total de 138 milhões em idade laboral.

– O restante não consegue se adequar à legislação, não são protegidos pela CLT. Querer acreditar que a nossa legislação é moderna ou foi modernizada ao longo do tempo, e que permite uma relação equilibrada entre capital e trabalho, é desconhecer que o nosso país é campeão mundial em ações judiciais, são quatro milhões por ano. A maior parte é fruto das homologações dos sindicatos e gera retrabalho – disse.

Discussão

Senadores do PT foram unânimes nas críticas ao projeto de reforma. Paulo Paim (RS) defendeu a ação dos sindicatos e condenou a criação de um custo para o trabalhador que recorrer à Justiça trabalhista. Regina Sousa (PI) criticou a proposta que obriga o trabalhador a assinar um termo de responsabilidade depois de advertido pela empresa sobre as precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho. Já Gleise Hoffmann (PR) afirmou que a redução do custo do trabalhador também diminui a renda, a proteção e os benefícios, com impacto na economia e queda no consumo interno.

Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) entende que o projeto não promove a modernização nas relações de trabalho nem deve aumentar a geração de emprego e a produtividade do trabalhador.

A senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) criticou a determinação do tempo de 30 minutos para o almoço do trabalhador e considerou inoportuna a proposta de reforma no atual cenário de crise política e econômica, com governo interino.

– Precisa atualizar, mas não podemos impor uma legislação num momento inadequado. Será que este é o momento para essa reforma? O texto original está mexendo só em sete artigos. Mas o projeto saiu da Câmara e veio para o Senado com 117 artigos alterados e 320 dispositivos, como vamos debater tudo isso num prazo de 15 a 20 dias? – questionou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

Brasil está atrasado em negociação trabalhista

Para Luciana Nunes Freire, da Fiesp, o engessamento da legislação do trabalho é uma das causas do alto desemprego no País

A diretora executiva jurídica da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Luciana Nunes Freire, avaliou que o Brasil está atrasado na liberdade de negociação trabalhista.

Com base em um estudo do Banco Mundial, ela sinalizou que o engessamento da legislação do trabalho é uma das causas do alto desemprego no País. Por isso, a executiva diz que a Fiesp apoia totalmente a reforma em tramitação no Senado.

“Há pontos da reforma que poderiam ser melhorados, mas preferimos apoiar o texto para que seja votado com celeridade. Porque quanto menos regulamentação, maior empregabilidade”.

De acordo com ela, uma pesquisa da Fiesp mostra que 77% dos empresários avaliam que uma maior segurança jurídica contribuiria para aumentar as contratações.

A pesquisa mostra que somente a aprovação final da medida criaria cerca de 170 mil postos de trabalho na indústria do Estado.

“Mesmo com a crise atual, os empresários se disseram dispostos a contratar cerca de 10% do volume atual de empregados do setor paulista por causa da maior segurança jurídica”, diz.

Luciana listou vários avanços da reforma em sua avaliação, como a criação do contrato intermitente, que dará direitos aos empregados que não trabalham em turnos formais.

A jornada intermitente permite contratar empregado e o funcionário só trabalhará e será remunerado caso a empresa o convoque com três dias de antecedência. Ela aponta como outro avanço, a demissão de comum acordo, que hoje é proibida pela lei, mas ocorre com bastante regularidade.

A executiva também criticou o argumento daqueles que são contrários à reforma que dizem que o projeto está sendo votado de forma muito rápida, atropelando a legislação trabalhista.

“A proposta passou de forma célere, mas foi bastante discutida com todas as partes em 20 audiências públicas.” Ela ainda refutou a crítica de que o projeto vai acabar com os sindicatos. “O ponto central da prevalência da negociação depende do sindicato.”

*FOTO: Thinkstock

Reforma vai desafogar Justiça Trabalhista

A proposta de reforma trabalhista em tramitação no Senado, o PLC 38/2017, é inovadora, ousada e deverá ser totalmente assimilada e colocada em prática em um prazo de 5 a 8 anos, pois vai impor uma nova cultura na relação empregado-empregador, baseada na livre negociação entre as partes.

A previsão é do especialista em Relações do Trabalho, José Pastore. O impacto imediato da flexibilização das leis do trabalho, na visão do especialista, será a redução do número de ações trabalhistas, que totalizam mais de três milhões por ano.

O número de processos que batem às portas da Justiça brasileira, segundo Pastore, é muito superior ao que ocorre em países que atualizaram suas legislações. Na França, por exemplo, são 75 mil ações por ano. Nos Estados Unidos, são movidos anualmente 135 mil processos trabalhistas.

Uma das alterações propostas que deverão frear a entrada de ações “indevidas” é a previsão do pagamento de multa e de indenização à parte contrária para reclamantes e reclamados que agirem de má fé ou recorrerem à Justiça para protelar o julgamento da ação.

“De forma gradativa, a reforma vai criar um ambiente de negócios mais favorável, pois as empresas vão perder o medo de contratar em face do cipoal da legislação em vigor e da insegurança jurídica provocada por súmulas do TST que têm força de lei”, afirmou.

Pelo texto aprovado pela Câmara no final de abril, reclamantes, reclamados e testemunhas que litigarem de má fé sofrerão sanções nos casos de alteração da verdade dos fatos, ou seja, quando mentirem em juízo.

O artigo 793 estabelece o pagamento de multa que pode variar 1% a 10% do valor corrigido da causa pelo autor da ação, nos casos de má fé. O texto também prevê pagamento de multa nos casos de não comparecimento do reclamante nas audiências.

AÇÕES MAIS COMUNS NO TST

De acordo com levantamento do Superior Tribunal do Trabalho (TST), horas extras, intervalo intrajornada e indenização por danos morais são os temas mais frequentes nos processos analisados pelo tribunal no primeiro trimestre deste ano.

Dos 249,2 mil processos em tramitação na Corte no final de março, o tema mais recorrente, presente em 45,9 mil deles, envolve a questão de horas extras. Na terceira posição, o intervalo intrajornada (de descanso e alimentação) aparece em 30,1 mil ações trabalhistas. O texto em análise no Senado modifica os três pontos.

No caso das horas extras, por exemplo, o seu uso passará a ser negociado também por acordo individual, de acordo com a proposta de reforma trabalhista. Na visão de Pastore, a negociação direta entre trabalhador e empregador é extremamente positiva para as duas partes.

“Quanto mais descentralizada a negociação, maior a chance de atender as necessidades tanto se empregadores como de empregados”, afirmou, durante palestra realizada nesta semana na Associação Comercial de São Paulo (ACSP).

FOTO: Estadão Conteúdo